Branco propõe retirar população de rua das calçadas e gera debate sobre exclusão social em Rio Preto

Rodrigo Lima
Vereador Anderson Branco durante sessão na Câmara /imagem – divulgação

O Projeto de Lei nº 210/2025, protocolado pelo vereador Anderson Branco (Novo), reacende um dos debates mais complexos e sensíveis da vida urbana em São José do Rio Preto: como lidar com a população em situação de rua. A proposta proíbe pessoas de utilizarem vias públicas, especialmente defronte a imóveis residenciais e comerciais, como espaço de permanência, higiene ou dormitório, e prevê encaminhamento a albergues, instituições conveniadas, tratamento de saúde ou até custeio de passagens para retorno à cidade de origem.

O texto parte do diagnóstico de que logradouros públicos teriam se transformado em “terras sem lei”, nas palavras do próprio vereador, ambiente propício para consumo de drogas, furtos e insegurança aos moradores e comerciantes. A justificativa sustenta que há vagas em abrigos e que a resistência em aceitá-las estaria ligada às regras mínimas de convivência desses espaços, como horários fixos ou a proibição do consumo de álcool e drogas.

A proposta, no entanto, carrega implicações que vão além da promessa de “resgatar a tranquilidade da população”. Ao tratar a rua como espaço proibido para os que nela vivem, transfere à esfera da lei penal e administrativa um problema de raiz social e estrutural. Ignora, ainda, o fato de que muitos equipamentos de acolhimento são alvo de críticas por sua precariedade, falta de vagas, ausência de atendimento especializado e condições de higiene insuficientes. A própria justificativa do projeto reconhece que há quem defenda a permanência nas ruas diante da insalubridade dos abrigos.

A medida, se aprovada, exigirá forte aparato de fiscalização, zeladoria e presença constante da assistência social. Mas resta a dúvida: ao retirar compulsoriamente pessoas das calçadas, sem garantir alternativas dignas e de fato aceitáveis, a cidade estará solucionando um problema ou apenas deslocando-o de lugar? A experiência de outras metrópoles mostra que políticas repressivas costumam gerar apenas o chamado “efeito deslocamento”, empurrando a população de rua para regiões mais periféricas, sem enfrentar as causas do fenômeno.

Ao insistir em um discurso de que “quem não aceita regras prefere viver na rua”, o projeto simplifica uma realidade marcada por múltiplas vulnerabilidades: dependência química, transtornos mentais, vínculos familiares rompidos, desemprego crônico e a ausência de políticas públicas integradas de moradia, saúde e renda. A lei, na forma em que está proposta, parece mais uma tentativa de limpar a paisagem urbana do que de enfrentar de modo sustentável uma questão social complexa.

Análise

A cidade de Rio Preto, como muitas cidades médias brasileiras, vive o desafio de conciliar o direito de ir e vir, a segurança pública e o direito constitucional à dignidade da pessoa humana. O projeto de Branco lança luz sobre a insatisfação de parte da sociedade com a situação das ruas, mas deixa em aberto a questão central: o que significa, na prática, oferecer condições “dignas” de acolhimento?

Enquanto essa resposta não for enfrentada de forma estrutural, a cidade corre o risco de aprovar uma lei que promete ordem, mas que pode aprofundar a exclusão social que afirma querer combater.

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