
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) manteve a validade da Lei Municipal nº 14.742/24 de São José do Rio Preto, que obriga instituições públicas e privadas que atuam com crianças e adolescentes a exigir certidão de antecedentes criminais de seus colaboradores. A decisão foi unânime, proferida pelo Órgão Especial do TJ, e considerou a regra constitucional.
A Prefeitura havia ajuizado uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) contra a lei, sob a alegação de que ela feria o princípio da separação dos poderes, invadia competência da União e violava direitos fundamentais como a proteção de dados pessoais, a privacidade, a imagem e a presunção de inocência.
Na análise, no entanto, o relator do processo, desembargador Luis Fernando Nishi, rejeitou todos os argumentos da prefeitura e classificou a lei como legítima. Ele ressaltou que a exigência de antecedentes não configura invasão de competência, uma vez que se trata de uma medida de interesse local, além de reforçar princípios constitucionais como o direito à informação e a proteção das crianças e adolescentes.
Interesse coletivo acima da privacidade
Um dos pontos mais sensíveis do julgamento foi a liberação do acesso dos pais e responsáveis às certidões de antecedentes dos funcionários das instituições. Para o magistrado, o direito coletivo deve prevalecer sobre interesses individuais nesse contexto.
“No equilíbrio entre o direito à informação e a proteção dos dados pessoais, deve prevalecer o direito à informação quando se trata da segurança de crianças e adolescentes”, escreveu Nishi no voto.
Segundo ele, não há violação à intimidade ou à privacidade quando se trata de proteger um grupo vulnerável, como crianças e adolescentes. O relator também lembrou que a própria Constituição garante o acesso a informações de interesse coletivo, ressalvados os casos que envolvem sigilo imprescindível à segurança da sociedade — o que não se aplica ao caso.
Presunção de inocência não é afetada, diz TJ-SP
Outro ponto questionado pela prefeitura e derrubado pela Justiça foi a proibição da contratação de pessoas que possuam sentença condenatória por crime doloso contra criança ou adolescente, ainda que sem trânsito em julgado.
O TJ-SP entendeu que essa exigência não viola a presunção de inocência, uma vez que não trata de punição penal, mas sim de critérios éticos para o exercício de determinadas funções, especialmente naquelas que envolvem contato direto com menores.
“A restrição é plenamente compatível com os princípios da moralidade administrativa e do interesse público”, afirmou o relator no acórdão. Ele ainda lembrou que a administração pública deve garantir que quem presta serviços a crianças não possua histórico de práticas que possam colocar esses menores em risco.
Sem inovação, sem inconstitucionalidade
O Tribunal também rejeitou o argumento de que a lei municipal apenas reproduziria uma norma federal, aprovada recentemente. De acordo com o desembargador, a mera reprodução de legislação federal não é motivo para declarar uma lei inconstitucional, desde que não haja conflito de competências.
“A inconstitucionalidade só se verifica quando a lei municipal colide com matérias de competência de outro ente federativo, o que não ocorreu no presente caso”, pontuou Nishi.
A decisão representa uma vitória para a Câmara Municipal de Rio Preto, autora da lei, e para os vereadores que defenderam a medida como uma ação de proteção à infância. Nos bastidores, vereadores contrários à gestão municipal comemoraram a decisão como uma derrota política para o prefeito, que tentou barrar judicialmente uma regra aprovada pelo Legislativo local.
A lei permanece válida e obriga todas as instituições — escolas, creches, ONGs, associações, clubes, igrejas e empresas — que atuam com crianças e adolescentes, a manterem certidões de antecedentes atualizadas a cada seis meses. Pais e responsáveis têm direito de acessar essas informações.
Ao final do julgamento, o desembargador relator determinou que a Prefeitura de São José do Rio Preto e a Câmara Municipal sejam devidamente comunicadas da decisão.