O juiz da 2ª Vara Criminal, Luís Guilherme Pião, absolveu grupo acusado de crimes cometidos por conta do descarrilamento de trem que resultou na morte de oito pessoas no Jardim Conceição, em novembro de 2013, em Rio Preto. O Ministério Público havia denunciado o maquinista e representantes da antiga concessionária pelos crimes de homicídio e lesão corporal. Entre as vítimas uma criança e uma gestante, além de outros oito feridos sem gravidade.
O episódio comoveu a cidade na época. “O acidente ferroviário ocorrido, de sua parte, apresenta elevadíssimo grau de tragicidade, porque ceifou a vida de oito pessoas, e lesionou outras oito. Longe do exagero afirmar que não somente estes últimos, mas outros tantos moradores circunvizinhos à linha férrea jamais durmam em paz diante do que houve. Uma Sentença, mesmo que condenatória, não trará os primeiros à vida, e não afastará das mentes dos sobreviventes a verdadeira cena de guerra com que se depararam. Deve buscar, porém e evidentemente, aplicar o direito de forma correta. Este é o objetivo, e também, o limite, da Justiça”, escreveu o magistrado a sentença.
O juiz citou ainda que “a responsabilidade penal depende a prova absoluta de que os réus agiram com culpa, mais especificamente com imprudência, modalidade descrita na denúncia. Os pontos cruciais no processo são: se a velocidade da composição contribuiu decisivamente para o evento e suas dimensões”, afirmou o Pião na decisão ao mencionar que o responsável por tal velocidade, incluindo-se as questões atinentes à respectiva restrição; a existência de empeno na linha férrea e suas circunstâncias.
Na análise do caso, o juiz citou que não há controvérsia sobre a velocidade aproximada da composição, cerca de 44km/h. “Argumenta o Ministério Público que essa velocidade foi imprimida porque a restrição que havia fora retirada de forma imprudente, por ordem do acusado Alexandre, efetivando-se com a participação em cadeia dos corréus Alexander e Marcos, e que ela, velocidade, foi determinante para o acidente e as para suas consequências, bem como que o empeno na via férrea deveria ter sido corrigido”, consta em outro trecho da decisão.
Pião concluiu após avaliar as provas que não há como confirmar de forma segura a tese esboçada na denúncia, no sentido de que a velocidade foi a causa do acidente (ou, ao menos, fator agravador de suas consequências), associada ao empeno na via férrea. De acordo com o magistrado, a prova oral também não confirma a acusação. Acerca da controversa retirada da restrição, afirma o Ministério Público que a velocidade para o trecho onde ocorreu o fato foi determinada pela Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT) em 25 Km/h, e que essa restrição foi retirada por determinação imprudente de funcionários da empresa.
A Justiça examinou diversos laudos periciais. “A questão relativa ao limite de velocidade não guardava relação com riscos de acidentes envolvendo as composições em si próprias. O que motivou referido limite era exclusivamente atinente ao fluxo horizontal de pessoas e de veículos. Não vislumbro possível, após analisar toda a prova, que a retirada de tal restrição, ainda que ilegal, possa servir como alicerce para atestar culpa, na modalidade imprudência. O mesmo não se daria caso estivéssemos diante de um acidente envolvendo dinâmica horizontal de tráfego (hipótese em que ela, retirada da restrição, poderia indicar imprudência)”, consta na sentença.
Pião afirmou ainda que para que se embasasse a condenação criminal por imprudência, “nesse caso, seria necessária a comprovação absoluta de que o assim chamado empeno fosse de tal monta que propiciasse o acidente (ou o agravasse), e que não foram tomadas as providencias cabíveis a respeito dele”. “Mas essa prova não existe no processo. Ocorre que (e isso é incontroverso), inúmeras composições passaram pelo local, em velocidade similar, inclusive no mesmo dia do acidente, nada ocorrendo, a reforçara tese que ocorreu abrupto e inesperado afundamento do solo, tese essa que não é pacífica nos autos, mas sim, é preponderante nas provas técnica e oral, conforme detalhado acima. Se um evento ocorreu de forma inesperada e abrupta, conforme consta de forma preponderante das provas periciais e orais, não mais é compatível com a culpa, em qualquer das suas modalidades (as quais, em verdade, implicam, ontologicamente, imprudência)”, consta na decisão.
Por fim, o magistrado conclui que não é possível extrair do processo, “que a via férrea reclamava atenção especial em razão desse empeno”. “Por todos estes motivos, entendo que não ficou comprovada com a necessária certeza a imprudência dos acusados Alexandre de Moraes Zanelatto, Alexander Danielli e Marcos Betineli, e por este fundamento devem ser absolvidos”, consta na sentença.