
Mesmo inelegível, Jair Bolsonaro (PL) continua sendo peça-chave no xadrez político de 2026. Pesquisa Datafolha divulgada neste sábado, 5, mostra que, se as eleições presidenciais fossem hoje, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sairia na frente em todos os cenários simulados, inclusive em disputas diretas contra figuras que orbitam – ou disputam – o espólio político do ex-presidente.
Os dados revelam que, com Bolsonaro no páreo, Lula aparece com 36% das intenções de voto, contra 30% do ex-presidente. Em seguida vêm Ciro Gomes (PDT), com 12%; Pablo Marçal (PRTB), com 7%; e o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), com 5%. Brancos e nulos somam 9%, e 2% dos entrevistados não souberam responder.
No Planalto, auxiliares de Lula consideram o resultado como um “retrato de estabilidade”, mas monitoram com atenção os desdobramentos em torno da inelegibilidade de Bolsonaro. Embora afastado da disputa por decisão do TSE, o ex-presidente ainda funciona como um polo agregador da direita e sua influência é um fator de coesão – ou de conflito – entre os pré-candidatos do campo conservador.
De acordo com aliados próximos a Bolsonaro, ele tem dito que não pretende “lavar as mãos” em 2026 e quer ser o fiador de um nome competitivo. A dúvida, dentro do próprio PL, é se o bolsonarismo será capaz de transferir votos na mesma proporção – especialmente em cenários em que os herdeiros políticos dividem o eleitorado.
Cenário sem Bolsonaro: Tarcísio é testado, mas resultado gera dúvidas
Quando Bolsonaro é retirado da disputa e substituído por nomes como Tarcísio de Freitas (Republicanos), o governador de São Paulo, o desempenho do bolsonarismo sofre. Lula mantém os mesmos 35% nesse cenário, mas Tarcísio aparece com 15% – uma queda de 15 pontos em relação ao capital eleitoral de Bolsonaro. Ciro e Marçal empatam com 11%, Ratinho Junior (PSD) surge com 5%, seguido por Leite (3%), Romeu Zema (Novo) com 3% e Ronaldo Caiado (União Brasil), com 2%. Brancos, nulos e indecisos somam 14%.
Nos bastidores, aliados de Tarcísio avaliam que o governador precisa “desgrudar do rótulo de herdeiro” para consolidar sua imagem nacional. Ele tem reforçado a pauta de gestão em São Paulo e se mantém afastado de polêmicas bolsonaristas, o que incomoda parte da base mais ideológica.
Já o entorno de Bolsonaro tem reservas sobre Tarcísio. Avaliam que o governador “pode até ser um bom gestor”, mas falta “combatividade”. Uma fonte próxima ao ex-presidente foi direta: “Tarcísio ainda precisa provar que pode bater de frente com o Lula”.
Eduardo e Michelle: nomes da família em teste
O Datafolha também simulou cenários com dois nomes da família Bolsonaro: o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro. Com Eduardo, Lula segue na dianteira com 35%. O parlamentar aparece em terceiro lugar, com 11%. Ciro tem 12% e Marçal, 10%. Ratinho vem com 6%, Zema e Leite, empatados com 4%, e Caiado com 3%.
Michelle, por sua vez, aparece mais competitiva. No cenário testado, Lula lidera com 35% e a ex-primeira-dama fica em segundo lugar com 15%. Ciro mantém os 12%, seguido de Marçal (10%), Ratinho (5%), Zema (4%), Leite (3%) e Caiado (3%).
Interlocutores do PL dizem que Michelle é o “plano B mais viável”, caso Bolsonaro seja impedido de apoiar um nome com musculatura própria. Mas ela resiste. A ex-primeira-dama não se vê como política e não está convencida de que quer trocar a militância evangélica por palanques e debates.
Cenário “enxuto”: Lula venceria com folga
Num cenário mais restrito, com Lula, Tarcísio e Pablo Marçal, o petista dispara: teria 43%, contra 24% de Tarcísio e 15% de Marçal. É um dos quadros em que o presidente apresenta maior vantagem – o que reforça, segundo seus aliados, que a fragmentação da direita ainda é um trunfo para o Planalto.
Quando nem Lula nem Bolsonaro estão na disputa
O Datafolha também testou um cenário hipotético sem os dois principais nomes da política nacional – Lula e Bolsonaro. Nesse caso, o ex-ministro Ciro Gomes aparece na liderança, com 19%, seguido por Tarcísio (16%) e Fernando Haddad (PT), atual ministro da Fazenda, com 15%. Marçal pontua com 12%, e os demais candidatos seguem com desempenho inferior.
Esse resultado é visto com cautela por petistas. Embora Haddad tenha se tornado uma figura com projeção nacional, inclusive com interlocução com setores do mercado, o partido entende que ele ainda enfrenta resistência em regiões como o Nordeste – onde o “lulismo” é mais forte que o próprio PT.
Bolsonaro ainda lidera sem Lula
No cenário invertido – sem Lula, mas com Bolsonaro na disputa – o ex-presidente reaparece em primeiro lugar, com 32%, seguido por Ciro Gomes com 20% e Haddad com 17%. O desempenho de Bolsonaro, mesmo inelegível, é uma mensagem clara: ele segue sendo o maior nome da oposição.
Essa leitura é compartilhada por integrantes do Centrão e de partidos que hoje integram a base do governo, mas mantêm um pé na oposição. “Enquanto Bolsonaro estiver na mesa, ninguém fecha questão com outro nome”, disse um presidente de partido ao blog.
Os números: método e abrangência
A pesquisa foi feita entre os dias 1º e 3 de abril, com 3.054 entrevistas presenciais em 172 municípios. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.
Leitura final: 2026 ainda está longe — mas não tanto
A eleição presidencial está a um ano e meio do início oficial da campanha, mas os tabuleiros já estão em movimento. O Datafolha de hoje mostra que Lula lidera, mas não com folga suficiente para se acomodar. O nome mais competitivo da direita ainda é Bolsonaro e o fato de ele estar fora da corrida por decisão judicial não elimina sua centralidade no jogo.
Mais do que os percentuais, o que o levantamento deixa evidente é que o eleitorado ainda está ancorado em figuras já conhecidas. Fora do eixo Lula-Bolsonaro, nenhum nome rompe a barreira dos 20% – e todos os que tentam se viabilizar terão o desafio de construir uma identidade nacional e um discurso que vá além da rejeição.
Enquanto isso, nos bastidores de Brasília, a disputa já começou.