“Me sinto um ninguém”. A frase é de uma mulher, de 25 anos, que vive na “cracolândia”, localizada embaixo do viaduto da rua João Mesquita em Rio Preto. O Diário do Rodrigo Lima acompanhou o juiz da Infância e Juventude, Evandro Pelarin, e um grupo de lojistas no local neste sábado, 6,
Antes de entrar em um dos corredores que desembocam na cracolândia, o magistrado orienta a não registrar imagens ou fazer fotografias. Os usuários não gostam, ficam arredios e até agressivos diante dos celulares. O cenário é devastador, o juiz retornava ao local pela sexta vez, e já chama algumas das pessoas pelo nome.
A mulher do início da reportagem disse que usa drogas desde os 13 anos. Tem três filhos, e pela terceira vez Pelarin estava no local para tentar resgatá-la. E novamente, ela respondeu: “volta amanhã”. O trabalho de abordagem social no local é feito com extrema cautela.
Um dos homens abordados pelo juiz, que não estava de paletó e gravata, mas de camisa de time de futebol e boné, respondeu: “estou na loucura”. Enquanto isso, foi possível ver outros homens – alguns jovens inclusive – estavam com cachimbos nas mãos para fumar crack. Essa é a droga mais consumida no local.
A todo momento há pessoas saindo pelos corredores paralelos ao viaduto, que tem o movimento intenso de ônibus. Um rapaz jovem retornou das ruas com balas e doces, que provavelmente vende nos semáforos para conseguir dinheiro.
Pelarin, que recebeu a missão do prefeito Edinho Araújo (MDB) de encontrar um caminho para ajudar aquelas pessoas, diz que na cracolândia tudo tem preço. Nada é de graça entre os usuários. Ele cita, por exemplo, que a tragada no cachimbo, que leva muitas vezes uma pedra de crack do tamanho de um grão de arroz, custa R$ 2.
Segundo o magistrado, os usuários usam gírias entre eles, como o “fazer o adianto”, que é tentar conseguir dinheiro vendendo balas no semáforo, comida e roupa. “A pedra é metade de um grão de arroz. Ninguém dá tragada de graça”, afirmou Pelarim ao dizer que o crack não dá overdose. “O crack é a pior droga porque ela escraviza a mente e o corpo físico das pessoas. Essas pessoas dificilmente voltam à vida normal”.
De acordo com o magistrado, há muitos dependentes químicos e o objetivo é encaminhar para tratamento. “Nós conseguimos encaminhar dez pessoas. Dessas dez pessoas, duas continuam limpas, já em tratamento. Agora as outras fugiram e não conseguiram aguentar o tratamento”, afirmou Pelarin.
Tubulações
Durante a semana, a Guarda Municipal e o Serviço Municipal de Água e Esgoto (Semae) estiveram no local e encontraram uma escada em um acesso às galerias de água pluvial. A suspeita é de que essas tubulações que desembocam no rio Preto ou que seguem pela avenida Bady Bassitt.
O magistrado mostrou para os comerciantes que, além de ser usado para fugir das abordagens policiais, as galerias servem de depósito de lixo, principalmente de marmitas, restos de alimentos e roupas. A expectativa é de que a autarquia feche esses acessos existentes ao longo da linha férrea.
De acordo com Pelarin, um dos pontos que serão debatidos com as entidades assistenciais de Rio Preto será a organização de distribuição de alimentos. E alguns casos, marmitas que estão sendo entregues aos dependentes químicos são vendidas na região central da cidade. E com o dinheiro, eles compram drogas.
Enquanto o grupo estava neste local, um homem passou cambaleando. Ele estava com ferimento próximo de uma das mãos.