PODCAST – Saiba tudo sobre o transplante de medula óssea; médico da Funfarme fala sobre mitos da doação

Rodrigo Lima

Na ponta da linha do Sistema Único de Saúde (SUS), onde esperança e ciência se entrelaçam, o Hospital de Base (HB) e Hospital da Criança e Maternidade (HCM), por meio da Funfarme, ergue-se como um dos maiores centros de referência em transplante de medula óssea do Brasil. Com estrutura de ponta, equipe multidisciplinar e impacto nacional, a instituição atende pacientes de diversas regiões – e oferece não apenas tratamento, mas a chance real de uma nova vida.

Quem explica os bastidores dessa missão de salvar vidas é o médico onco-hematologista João Victor Piccolo Feliciano, coordenador da Unidade de Transplante de Células-Tronco Hematopoéticas (TCTH) da Funfarme. Em entrevista ao Podcast Diário do Rodrigo Lima, ele detalha o funcionamento do centro, os avanços na medicina, os desafios da doação e o que torna o trabalho da equipe tão singular.

Com 15 leitos para adultos e crianças, a unidade especializada em transplantes hematopoéticos da Funfarme está preparada para realizar procedimentos tanto autólogos (com as próprias células do paciente) quanto alogênicos (com células de doadores aparentados ou não-aparentados).

A estrutura foi pensada para atender pacientes imunodeprimidos: os quartos são equipados com filtros HEPA (High-Efficiency Particulate Air), que reduzem drasticamente o risco de infecções – especialmente as fúngicas, potencialmente fatais em quadros onco-hematológicos.

“A gente costuma dizer que no transplante, o tratamento não acaba quando termina. A fase pós-transplante é um capítulo à parte. Por isso, ter uma estrutura como a da Funfarme muda tudo”, explica João.

Duas modalidades, um só objetivo: salvar vidas
O transplante autólogo, como explica o especialista, é uma estratégia para viabilizar altas doses de quimioterapia. “A quimio, em si, é o tratamento do câncer. Mas ela destrói também a medula do próprio paciente. Então, recolhemos suas células antes e as reinfundimos depois. É como plantar de novo o sangue dele.”

Já o transplante alogênico envolve um doador externo e, segundo Dr. João, traz um potencial curativo ampliado graças ao “ataque imunológico” da medula nova sobre as células cancerígenas do paciente. É nesse contexto que o Redome (Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea) se torna essencial.

“Hoje, o Brasil tem o terceiro maior banco de doadores do mundo. Só perde para os Estados Unidos e o bloco europeu. E a Funfarme integra essa rede global de forma ativa, inclusive com envio e recebimento de material do exterior.”

|Uma rede que vai além do sangue
O sucesso do transplante depende de uma rede que vai muito além dos médicos. Nutricionistas, psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas e enfermeiros especializados formam o time que acompanha os pacientes desde a triagem até anos depois do procedimento.

“Não tratamos apenas a doença. Tratamos o indivíduo — e, junto com ele, sua família, que também adoece emocionalmente. O acolhimento multiprofissional é vital”, reforça.

Dr. João destaca que muitos dos pacientes vêm de outros estados e dependem de apoio socioeconômico para se manterem na cidade durante o tratamento. Programas sociais, ONGs e a própria estrutura do SUS são mobilizados para manter essas pessoas seguras e amparadas.

E o transplante pediátrico?
O Hospital da Criança e Maternidade (HCM), também ligado à Funfarme, é um dos centros com maior número de transplantes pediátricos do país — 112 realizados até agora. A unidade possui quatro leitos dedicados à modalidade e atende 102 municípios.

“A leucemia linfoblástica aguda é o câncer mais comum na infância. Felizmente, muitas crianças se curam só com quimioterapia. Mas algumas precisam do transplante. Quando isso acontece, a gente entra com tudo: tecnologia, equipe e, principalmente, empatia.”

Segundo o especialista, as crianças costumam responder melhor ao tratamento. “Elas têm menos comorbidades, toleram melhor a quimio e, biologicamente, são mais resilientes. Muitas dão um show de recuperação.”

O tabu da doação de medula
Um dos maiores obstáculos no Brasil ainda é o medo — injustificado — sobre o processo de doação. Dr. João explica que o procedimento é seguro, voluntário e pode ser realizado de duas formas: com punção na bacia, sob anestesia, ou pela coleta via sangue periférico, após estímulo com medicações.

“É um gesto de amor. Quem doa, oferece uma nova chance a alguém que talvez esteja entre a vida e a morte. E o processo é acompanhado, respeitoso e gratuito. O SUS cobre tudo.”

Ele também esclarece que o doador pode se recusar até o último momento. “Nada é forçado. Tudo é feito com autonomia e consentimento.”

Sucesso e desafios
Dr. João evita falar de “cura” como única medida de sucesso. “Transplante é agressivo, exige muito fisicamente. Sucesso é também proporcionar qualidade de vida. Às vezes não curamos, mas controlamos a doença e devolvemos anos de vida ativa ao paciente.”

A Funfarme, segundo ele, tem avançado na consolidação como centro de excelência. “Hoje temos capacidade para transplantar pacientes com compatibilidade de 50%, como pais e filhos. Isso amplia muito as possibilidades.”

Apesar dos avanços, os desafios permanecem: ampliar o número de doadores, enfrentar o desconhecimento da população e seguir investindo em estrutura e formação de equipes.

O apelo final: doe medula, doe vida
João finaliza com um recado que é quase um apelo: “Quando você se cadastra como doador, você se torna uma esperança viva para alguém. Muitas vezes, você será a única chance de cura de um paciente. O Brasil precisa de mais empatia, mais solidariedade e mais gestos concretos de amor.”

Para se cadastrar como doador, basta procurar o Hemocentro ou Hemonúcleo mais próximo. Em São José do Rio Preto, o telefone é (17) 3201-5151.

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